A metafísica do riso ou o riso da metafísica
por Marcelo Consentino
Tudo está bem quando acaba bem.
(Shakespeare)
…e se não está bem é porque ainda não acabou.
(Emenda popular)
Há uma vida eterna? Há um outro mundo além deste, perfeito, eterno e bom? Ou seremos só moléculas soltas num tempo e espaço indiferentes – frágeis e belas bolhas que luzem por instantes até estourar no vazio? A realidade natural, transitória e mortal será a única ou o haverá uma realidade sobrenatural, eterna, ideal, metafísica? E que teremos nós a ver com ela? Filósofos, místicos e sábios de todos os tempos tentaram responder a esta pergunta. Ouso meter minha colher nesse meio e afirmar que sim: o homem é um ser metafísico, espiritual; sim, somos todos chamados a viver eternamente. Posso provar? Não creio, nem quero. Mas há sinais e penso ser possível indicá-los a quem quiser recolhê-los e tentar responder a essa pergunta por si só – se é que o problema lhe interessa.
Um destes indícios é a arte, a poesia. A arte não só imita a natureza, mas a supera. Obras de arte não são simples cópias das realidades exteriores e individuais. Um poeta que canta o amor ou a alegria não descreve meros estados de ânimo privados, mas o que neles há de essencial, ideal e universal, comum a todos nós. Não o faz, todavia, por abstrações – nada mais contrário à arte! –, e sim condensando imagens concretas, e por isso faz vibrar o coração. É por essa união do ideal com o real que a arte nos desperta uma impressão mais forte e potente do que qualquer fenômeno particular. O que eu tenho a dizer sobre minhas experiências amorosas só interessa a mim e quiçá a mais meia dúzia. O que Shakespeare diz interessa a todos, porque não fala simplesmente do seu amor, mas do amor. E fala não por meio de conceitos abstratos, como os filósofos, mas sim por meio de Romeu e Julieta. E não só fala, mas canta – encanta –: é o amor materializado e em movimento; vivo! Assim, a poesia não é só essa ou aquela emoção particular e real, nem só uma definição abstrata e ideal, mas sim a fusão de ambas em uma imagem dinâmica, viva. “A poesia”, diz Pessoa, “é emoção expressa em ritmo através do pensamento”. E se um homem pode produzir estas imagens e se nós outros podemos compreendê-las, isto significa que participamos desta realidade ideal, metafísica, e que portanto o homem é um ser metafísico.
Não tenho a certeza de ter sido compreendido pela maior parte de meus leitores. Numa época em que a vanguarda subjetivista contemporânea acha incrivelmente mais interessante reproduzir qualquer dor de dente ou cotovelo sua do que as colinas e cavalos do antigo realismo ingênuo, é difícil decidir qual dos dois é mais monótono e distante dos autênticos fins espirituais da arte. De todo modo, outro indício – para desgosto de positivistas et caterva, hostis a toda metafísica –, é a própria ciência positiva. As ciências se fundam, em primeiro lugar, na crença de que há certas leis e princípios universais e atemporais, comuns a toda uma classe de fenômenos concretos. E, em segundo, na crença de que o homem é capaz de apreender estas mesmas leis e princípios. Leis e princípios lógicos e metafísicos, portanto. Sinal, mais uma vez, de que o homem é um ser metafísico.
Um terceiro indício é o humor. Ah, leitor, vejo que tens vontade de rir. “Agora basta!”, dirá o cético já não se contendo. O humor?! Então esse humor que usamos todos os dias para passar o tempo – quando não para matá-lo – acaso nos desvelará a eternidade? As brincadeiras que aliviam as asperezas do dia-a-dia em esquinas, bares e escritórios; as piadas que desembrulhamos em risos que caem pelo chão como papéis de bala – como poderá ser isso sinal de uma realidade superior e eternamente bela? Que haverá de metafísico em prazer tão prosaico e trivial? Ma… non è una cosa seria! Sim, é – seriíssima! Repito: o homem é um ser metafísico porque ri.
Vamos lá, leitor amigo, dá-me alguns minutos de teu tempo e tentarei demonstrá-lo, melhor, mostrá-lo somente. Vamos – na melhor das hipóteses sairemos com alguma esperança de que esta nossa vida, minúscula e maravilhosa vida, não é o fim; na pior, poderás rir alguns bocados à custa dos ridículos esforços deste humilde servo. Vamos, porque a coisa é divertida!
O animal que ri
Assim é o homem. Não o digo eu, mas Aristóteles, que sabia mais coisas entre o céu e a terra do que sonhava o taciturno príncipe Hamlet. É certo que os animais sempre foram fonte profícua de observação para psicólogos e de inspiração para poetas. Neles encontramos nossas emoções em sua ancestralidade mais pura – ora cruéis ora doces, mas sempre livres de qualquer cálculo, raciocínio ou dissimulação. Olha de um lado a outro, de cima a baixo o reino animal e verás em carne viva a agonia, o gozo, o pavor, a angústia, a cólera. Mas também emoções mais sutis, mais “humanas”, por assim dizer. Vestígios de compaixão e de amor? Sim, por que não? Afinal, quão sugestivo não foi em todos os tempos um simples casal de pássaros para o coração humano, do mais vulgar ao mais poético? Verás ainda sentimentos mais sombrios: a melancolia, o tédio. E assim, Manuel Bandeira divertia-se observando os cães da roça, “estes cães que parecem homens de negócios: andam sempre preocupados”.
Algo, porém, que os animais não fazem jamais é rir. Podem mesmo chorar, mas o mais leve sorriso foi negado pela natureza aos seus lábios rígidos. Entendamo-nos, pois a questão é séria. Não falo da alegria. Filhotes jogam, brincam, se divertem. Mesmo animais adultos parecem saber temperar a monotonia cotidiana com alguma forma de entretenimento. E quem poderá sondar as delícias saboreadas pelas aves marinhas em seus seus sublimes vôos contemplativos ao longo do imenso azul? Mas onde se achará a descarga do riso, onde a explosão da gargalhada? Não; nossos animais poderão nos acompanhar na saúde e na doença, na alegria e na tristeza; poderão se enfurecer e se afligir conosco, mas algo que jamais faremos juntos é rir. O humor pertence ao humano e ao humano somente – nenhum animal jamais viu algo engraçado no mundo. E assim, mesmo aquele grego tão rigoroso não hesitou em arrolar lado a lado com suas definições do ser humano – o animal racional e o animal político – esta outra, de aparência tão irreverente: o animal que ri.
Deixemos portanto o sorriso sereno da alegria por aqui – quiçá o reencontraremos novamente no fim do caminho – e concentremo-nos doravante naquilo que é só nosso: o riso do cômico. A comédia, a gozação, a sátira, a troça, a chalaça, o escárnio, a galhofa, a burla, a ironia, o sarcasmo: eis as veredas pelas quais haveremos de nos enfiar. Passo a passo, sigamos com atenção – e com uma pitada de irreverência, que cai bem com o tema –
guiados pela regra de ouro de toda investigação: partir do que é próximo em direção ao distante; do conhecido rumo ao desconhecido.
Fenomenologia do riso
O animal que ri! Bergson – em seu delicioso O riso, o melhor livro, em minha opinião, sobre o tema – nota que uma definição igualmente justa seria a de animal que faz rir. Pois se qualquer animal ou objeto inanimado é engraçado, o é só por sua semelhança com o homem, pela marca que o homem lhe imprime ou pelo uso que o homem lhe dá. Uma paisagem será feia, agradável, sublime, mas nunca cômica – a arquitetura de um prédio ou a forma de um chapéu, por sua vez, podem ser. E mesmo a pachorra de um sapo, a marcha de um pato, a preguiça de um porco; tudo isso só é divertido pelo que lhe atribuímos de humano – como o gato, que parecia a Machado de Assis um animal metafísico sem nunca ter lido Kant. Vemos a nós mesmos neles, e rimos. Não à toa os macacos, primos em primeiro grau, nos parecem os mais cômicos dos animais: são nossa caricatura. Uma vez mais: o humor é coisa humana. Só o homem ri, só o homem faz rir e, em última instância, o homem só ri do próprio homem.
Qual é a primeira coisa que experimentamos ao rir? Alívio e descontração. (Se os gatos lessem Kant, dariam com esta definição: “o riso é uma tensão que se dissolve subitamente em nada”). Que não nos escape o detalhe: não só descontração, como no suspiro e nas lágrimas, mas também alívio, isto é, elevação. Faze agora mesmo a prova se quiseres. Experimenta soltar um longo suspiro de desabafo ou enfado. Agora ri, sim, ri sem motivo. Qual o movimento do corpo? Descompressão do ar e descarga de peso em ambos os casos, certo? Mas acaso não é verdade que no suspiro o corpo parece querer derramar-se pelo chão, ao passo que no riso tende a erguer-se dele? Quem ri se eleva.
Em segundo lugar, o riso exige, por assim dizer, um destaque ou desligamento temporário de nossas emoções. Quanto mais compaixão, medo ou ódio sentirmos por uma pessoa, menos conseguiremos rir dela. É preciso um certo desprendimento. Qualquer impulso de atração, repulsa ou agressividade intenso demais sufoca o riso. Um homem escorrega numa casca de banana: isto é engraçado – mas não será se rachar a cabeça no meio-fio. Após um instante de pânico só começaremos a rir se constatarmos que está tudo bem. Uma insensibilidade momentânea do observador em relação ao seu objeto, e vice-versa, parece ser assim indispensável para o riso. “Destaquemo-nos por um instante e assistamos à vida como espectadores indiferentes: muitos dos dramas se inverterão em comédia. Basta que tapemos as orelhas ao som da música em um salão onde se dança para que os dançarinos nos pareçam instantaneamente ridículos… Assim o cômico – constata Bergson – exige, para produzir todo o seu efeito, algo como uma anestesia momentânea do coração. Ele se dirige à inteligência pura”. De fato, “sentimos” dor, aflição ou prazer, mas ninguém “sente” graça de nada; só se “acha” graça das coisas. Quem ri contempla.
Além disso, o ambiente natural do riso é o grupo. “Não se gozará do cômico se alguém se sente isolado”. O que a princípio soa estranho, pois quem nunca riu sozinho? Ainda assim, o riso parece tender ao contágio, à propagação, “como se tivesse necessidade de um eco”. Entramos numa sala repleta de homens que riem descontroladamente e imediatamente somos contaminados. É espontâneo. O riso parece supor assim uma espécie de cumplicidade natural com outros ridentes, reais ou imaginários; é tendencialmente um gesto social. “Para se compreender o riso, é preciso colocá-lo em seu meio ambiente, que é a sociedade; é preciso determinar sua função útil, que é uma função social… O riso – segunda constatação – deve ter uma significação social”. Quem ri quer se unir.
Juntemos tudo isto e obteremos as condições subjetivas do humor. “O cômico nasce, ao que parece, quando homens reunidos em grupo dirigem toda a sua atenção sobre um deles, calando a sua sensibilidade e exercendo somente a sua inteligência”. Coisa curiosa; pois vejo que se reencontram aqui entrelaçadas as três definições de ser humano: animal racional (que possui inteligência), animal político (que vive em comunidade) e animal que ri (ou que faz rir). O homem ri, portanto, porque faz um juízo crítico de outro ou outros homens dirigido a outro ou outros homens.
Até aqui as condições subjetivas, isto é, as disposições de quem ri. Mas quais serão as condições objetivas? Digo, do que exatamente se ri? O que é engraçado? É certo que o riso nasce de uma crítica, em outras palavras, da constatação de um certo estado de coisas pela nossa inteligência, mas não menos certo é que nem todo estado de coisas é cômico. Muitas tentativas já foram feitas de se definir o objeto do humor. A surpresa – a imprevisibilidade, o improviso – é certamente uma condição sine qua non. Uma piada é realmente engraçada pela primeira vez. Na segunda, terceira e quarta rimos por reverberação, se tanto. O humor deve ser surpreendente.
Também o desconcerto – o desequilíbrio, a contradição, o contraste, a incoerência – parece ser outra característica das mais evidentes. “Para que uma coisa seja cômica é preciso que entre o efeito e a causa haja desarmonia” (Y. Delage). Riríamos assim toda vez que constatássemos alguma inadequação, um tipo qualquer de desacerto ou desencaixe em uma dada situação – qualcosa che non va, como dizem os italianos, gente tão cômica. A arte de pregar peças baseia-se fundamentalmente nestes princípios. Certa vez fui convidado para uma festa. Lapso curioso, mas de resto inocente, é que só se lembraram de me avisar a mim – e a mais ninguém! – que era à fantasia. Um homem que repentinamente invade um salão de saia, peruca e batom é certamente ridículo, incongruente – situação, em suma, “desconcertante”.
Mas tudo isso não basta. Desconcertante é também toda injustiça e crueldade; e desarmônico é tudo aquilo que é feio, grotesco, repulsivo; assim como são imprevisíveis o câncer e a morte – coisas das quais seria preciso antes chorar do que rir. Desta forma, a imprevisibilidade e o “desconcerto do mundo” serão – para se dizer com os filósofos – causas necessárias, mas não suficientes do humor. Em tudo aquilo do qual se ri há certamente desconcerto, mas nem todo desconcerto é cômico – antes, com freqüência será trágico. É, portanto, um tipo específico de desconcerto que estamos buscando. Qual?
Bergson me parece bastante convincente em sua resposta. Sua tese nuclear é que o riso nasce como uma espécie de reprimenda que um determinado grupo dirige ao comportamento inadequado de algum de seus membros. Comportamento este que pode ser resumido nas idéias de distração e rigidez. “O que a vida e a sociedade exigem de cada um de nós é uma atenção constantemente alerta, em condições de discernir os contornos da situação presente, além de uma certa elasticidade do corpo e do espírito que permita nossa adaptação a ela. Tensão e elasticidade, eis duas forças complementares uma à outra que a vida põe em jogo”. Se faltam ao corpo, temos os defeitos, as deformidades, as doenças; se ao espírito, muitos tipos de pobreza psicológica, diversas formas de loucura, todo tipo de inadequação profunda à vida social. “Toda rigidez de caráter, do espírito e mesmo do corpo, será portanto suspeita à sociedade, porque ela é o sinal possível de uma atividade que se entorpece e também de uma atividade que se isola, que tende a se destacar do centro comum em torno do qual a sociedade gravita, de uma excentricidade, enfim”.
Concentremo-nos sobre esse ponto, pois daqui se difundirá uma multiplicidade de sugestões valiosas. O riso é, ao mesmo tempo, uma reação e uma correção a algo que desconcerta ou desequilibra a vida individual ou social. Trata-se, porém, de um desconcerto todo especial: o endurecimento e a distração da vida em sua relação com o entorno, ou ainda, na fórmula sintética de Bergson: a “mecanização da vida”. A vida se apresenta a nós como uma certa evolução no tempo e uma certa difusão no espaço. Capacidade de transformação, adaptação e expansão, eis aí as características que exprimem a vitalidade de um indivíduo. (Penso que tinha qualquer coisa assim em mente o editor desta revista quando escreveu, na terceira edição, seu Elogio do jeitinho). Uma contração desta vitalidade pede uma correção, um retoque ou redefinição, enfim, uma descontração. Esta é a função do riso. Compreende-se a imagem de Bergson para o objeto cômico: o mecânico incrustado sobre o vivente. “O cômico é este lado da pessoa pela qual ela se assemelha a uma coisa, este aspecto dos acontecimentos humanos que imita, por uma rigidez de um certo tipo, o mecanismo puro e simples, o automatismo, enfim, o movimento sem vida”. Daqui se desdobram duas séries paralelas de conceitos opostos com as quais o filósofo explora dialeticamente sua idéia. De um lado tudo o que é rígido – “mecânico”, “contraído”, “automático”, “inflexível”, “imóvel”, “duro”, “obstinado” –; de outro, tudo aquilo que é vivo – “móvel”, “versátil”, “maleável”, “plástico”, “gracioso”, “flexível”, “elástico”.
Será fácil agora extrair o fenômeno cômico da variedade de manifestações da vida humana; da vida do corpo à da inteligência. O que é engraçado em uma fisionomia, caricatura ou careta? “Automatismo, rigidez, dobras contraídas e retidas”. O que nos faz rir dos cacoetes de um orador tímido ou pedante? A repetição automática, não natural, porque “uma vida bem vivida não deve se repetir”. Do que zombamos e caçoamos em um amigo? Daquilo nele que é inautêntico, artificial, “a parte de automatismo que ele permitiu que se introduzisse em sua pessoa”. Por que tantas vezes etiquetas, cerimônias, e formalidades são risíveis? Por se tratarem de uma espécie de máscara rija que se veste sobre o corpo social, um disfarce temporário ou “um mecanismo sobreposto sobre a vida, [como sugere] a forma compassada de todo cerimonial”.
E que dizer de nosso caráter, atitudes, comportamentos, enfim, tudo aquilo que determina nossas relações com as outras pessoas? Que pode haver de cômico neles? “O cômico exprime antes de tudo uma certa inadaptação particular da pessoa à sociedade”. Isso faz com que o riso seja sempre um pouco vexatório, humilhante para a pessoa a quem é dirigido, pois ele revela sua exclusão, sua inadequação em relação ao grupo. “O cômico em um caráter individual tende sempre… a uma certa distração fundamental da pessoa”. E ainda, “é a rigidez que é suspeita à sociedade… Quem se isola se expõe ao ridículo, pois o cômico é feito, em grande parte, deste isolamento mesmo”. Daí que o tipo do distraído, o alheado, que vaga perdido no mundo da lua, seja tão cômico. Pelo mesmo motivo, também os apaixonados serão sempre um tanto cômicos. “Desatenção a si e por conseqüência ao outro… E se examinarmos a coisa mais de perto, veremos que a desatenção se confunde precisamente com a insociabilidade. A causa da rigidez por excelência é que o sujeito se recusa a olhar em torno de si e sobretudo para si”. Eis porque alguns dos melhores personagens cômicos são tipos, isto é, esquemas rígidos de comportamento que pré-determinam todas as atitudes do indivíduo tal qual uma marionete – o Avarento, o Jogador, etc. O que explica também a habilidade tão brasileira de etiquetar os amigos com apelidos divertidos segundo certos traços de caráter dominantes. Esse e outros tipos de brincadeiras amigáveis têm a função de advertir ligeiramente o outro para uma sua real ou possível inflexibilidade. “O riso tem justamente por objetivo reprimir as tendências separatistas. Sua função é converter a rigidez em flexibilidade, readaptar cada um a todos, enfim, arredondar os ângulos”.
Por último, quanto à vida da inteligência, o que poderá ser ridículo em nossas idéias, pensamentos, convicções? Retorna aqui a noção de contradição. É risível uma contradição tornada imagem, um “absurdo visível”, segundo Théophile Gautier. Ora, a vida da inteligência é o amor à verdade – adaequatio intellectus et rei, a adequação da mente à realidade, conforme a definição clássica. Assim, prossegue Bergson, “o bom senso é o esforço do espírito que se adapta e se readapta sem cessar, mudando de idéia quando muda de objeto. É uma mobilidade da inteligência que se regula exatamente sobre a mobilidade das coisas. É a continuidade de nossa atenção à vida”. De onde, então, poderão vir as idéias absurdas senão de uma inadequação da mente às coisas? “É uma inversão toda especial do senso comum. Consiste em pretender modelar as coisas sobre uma idéia que se tem, e não as idéias a partir das coisas. Consiste em ver diante de si aquilo que se pensa, em vez de pensar aquilo que se vê”. Estranha inversão: a realidade sendo reformulada pela mente – que provavelmente não anda lá muito satisfeita com ela. Coisa de doido, literalmente. “Um espírito que se obstina [em uma idéia fixa] acabará por dobrar as coisas à sua idéia, em lugar de regular seu pensamento pelas coisas”. Eis ali um senhor que vê gigantes onde todos vêem moinhos de vento. Isso é engraçado!
Antes de concluir essa sessão e passar à próxima, sintetizemos o que foi visto até aqui. A suprema seriedade da vida está na nossa capacidade de fazer escolhas, ou seja, em nossa liberdade. Toda vez que o homem não age livremente, mas automaticamente, inercialmente, ele se tornará de algum modo risível. Ao agir constrangida por alguma inclinação impessoal – seja externa ou interna –, a pessoa será cômica, enfim, “constrangedora”. A função do riso é precisamente descontraí-la, destravando suas energias vitais. “A alma”, diz o poeta Bruno Tolentino, exímio humorista, “a alma, por pior / que se esforce, só peca / quando se petrifica”. Acrescentemos que nesse caso, além de pecadora, será também cômica. É essa coisificação da pessoa que deve ser advertida pelo riso, deixando uma impressão levemente penosa, vexatória para aquele de quem se ri. É inevitável. Digamos sem hesitação: o riso liberta, mas liberta pela humilhação. “Epa!; isso já é um pouco duro e não tem lá muita graça”. Compreendo. Mas só pensamos assim porque tendemos a associar irrefletidamente a humilhação à ofensa e à opressão. A verdadeira humilhação, porém, deve visar a humildade. E a humildade, na definição de Tomás de Aquino, não é senão o “conhecimento das próprias fraquezas e limites”. É só reconhecendo nossas fraquezas que podemos nos tornar fortes; só poderemos ultrapassar nossos limites quando os virmos com clareza. (Não será escusado notar que “humor” e “humildade” têm possivelmente a mesma raiz etimológica. Certo; as raízes do antepositivo latino “hum” perdem-se na ancestralidade da tradição oral. Mas é seguramente a mesma partícula que forma “humus” – “terra” – e “humilis” – “humilde” –, ou seja, “o que permanece na terra, que não se eleva da terra”. E assim o “homo” – o “homem” – é a “criatura da terra”, em oposição aos deuses, criaturas do céu. Terá o “humor” um pé nesse meio? Hipótese incerta, porém plausível – e se non è vera, è ben trovata). Enfim, o riso liberta por revelação – “conhecereis a verdade e a verdade vos libertará”. Coisa de que passaremos a tratar na próxima sessão. Mas não sem antes retribuirmos a generosidade de mestre Bergson com seu divertido chapéu coco, deixando-lhe um amável sorriso de gratidão. Au revoir, monsieur!
Convido agora o leitor a aprumar-se a fim de requintarmos um pouco nossa jornada. De fato nos elevamos rumo aos domínios da mais fina e cativante donzela do reino do humor. Vejo que já nos olham seus olhos indecifráveis. A Ironia.
A idéia de ironia
Ah, a Ironia! Mulher tão sutil e cheia de mistérios que hesito em me aproximar de seus recintos sem ser levado pelas mãos de um mestre. Dante deu as suas a Virgílio, que o arrancou dos braços do Demônio e o entregou às de Beatriz. Sem muita esperança de dar com uma bela florentina no fim do caminho, passo as minhas logo a dois, Sócrates e Machado de Assis, e “deixo-me estar entre o poeta e o sábio”, como diz Brás Cubas. Mestres da ironia, eles nos ajudarão a desvelar seus enigmas. Com o interesse adicional de que um vem de longe, o outro está logo ali; um das ruas de Atenas, o outro da Tijuca; um da aurora deste nosso Ocidente, tão estúpido e genial, o outro de seu declínio. Ademais, não só dominam como ninguém as astúcias da ironia, mas também a encarnam em sua própria existência. Sócrates, que, convicto de uma missão divina, despertou tantos rapazes gregos para a verdadeira vida espiritual, foi condenado à morte por “irreligiosidade” e “corrupção da juventude”. Que ironia! Não menor que o sucesso pessoal de Machado – preto, pobre, gago, feio e epilético – na corte carioca com seus bacharéis de fraque e cartola. É também irônico que Sócrates, modelo maior de sábio e filósofo para Platão, declarasse que a única coisa que sabia era não saber de nada. Tão irônico quanto o fato de que, mesmo com todo o pessimismo que se lhe atribui, mesmo na época em que a boemia parisiense fazia da excentricidade e da transgressão as vacas sagradas da arte, Machado tenha sido um marido fiel, funcionário público exemplar e fundador da Academia Brasileira de Letras.
Que é, com efeito, a ironia?, “esse movimento ao canto da boca… feição própria dos céticos e desabusados,” segundo Machado. Bem diferente da histérica chalaça – a “gorda chalaça” –, do vulgar deboche e do antipático sarcasmo, a ironia é sutil. Ambígua, sim, mas sempre elegante, discreta – isso porque, diz o mesmo Machado, “o maior pecado, depois do pecado, é a publicação do pecado”. Num instante imponderável atinge nossos olhos com os seus, rouba-nos sem sabermos bem o que nem por que, e parte sem dizer para onde. A ironia é fogo que arde sem se ver; é ferida que dói e não se sente; é um contentamento descontente; é dor que desatina sem doer… (Nada mal! De onde me terá surgido tamanha inspiração?). Brincadeiras à parte, os versos de Renato Rus… perdão, os versos de Camões, como ia dizendo, sugerem algo importante sobre a substância da ironia: o contraste e o jogo de aparências. A ironia, em poucas palavras, consiste em dizer – sempre com discrição – o contrário daquilo que se pretende. Contraste, portanto, e mesmo oposição entre o interior e o exterior; o fundo e a superfície; a intenção e a expressão; o espírito e a letra; enfim, entre a realidade e a aparência. Isto quanto à sua forma. Que dizer de sua função?
O humor, já o vimos, tem sempre uma certa finalidade corretiva. A paródia e a sátira, por exemplo, são as ferramentas usuais de uma geração, classe social ou sexo para corrigir os desvios e excentricidades do outro. Pais e filhos; ricos e pobres; homens e mulheres ridicularizando-se entre si. (Embora, vale notar, haja também uma paródia, por assim dizer, metafísica, que ri não desta classe ou daquela geração, mas de todas). Ora bem, de quais excentricidades nos corrigirá a ironia e de que modo? Sim; pois a Ironia tem suas rivais – vêm lá a Vaidade e a Hipocrisia. Atentos, senhores, pois caímos em meio a um enfrentamento de mulheres, e mulheres de estirpe. Que nos escape uma só troca desses olhares felinos e ficaremos, como de hábito, às portas da compreensão. Cautela!, porque o que essas três senhoras têm em comum é precisamente o fato de que nunca são o que parecem ser. Quanta mágoa nos causa a Ironia! E, no entanto, é esse o seu jeito de revelar velando. Não digo o mesmo dessa moça, a Vaidade, menina frívola cujos caprichos e tolas veleidades traem sua ignorância. Já a Hipocrisia, ah mulher diabólica!, fêmea dissimulada! Envolve-nos com seus quereres, infla-nos com sua estima, só para melhor velar nossa miséria, da qual saberá escarnecer no devido tempo. Mas sejamos sérios, componha-se leitor: basta com maiúsculas e prosopopéias. Retornemos aos nossos problemas. De que modo a ironia desfaz o ridículo espetáculo de ilusões criadas em torno de nós pela vaidade e pela hipocrisia?
Retomemos o fio da primeira parte deste ensaio e vejamos se é possível amarrar alguma coisa aqui. O cômico, lá dizíamos, surge quando a vida, que deveria ser flexível, elástica, efusiva, se contrai, endurece e se isola. Inflexibilidade que pode enrijecer desde a vida do corpo até a da inteligência. A ação continuada da vaidade e da hipocrisia sobre nossa vida é das mais venais, pois contrai e isola o seu próprio centro: o coração. O coração é o órgão através do qual amamos os outros, afirmamos seu valor e autonomia, desejamos seu bem, sua felicidade. Também através dele os outros nos revelam o que têm de único e genuíno, sua intimidade mais profunda e pessoal. A vaidade intoxica nosso espírito levando-o a uma espécie de distração crônica em relação ao coração alheio e ao próprio. O veneno da hipocrisia, por sua vez, produz um endurecimento, uma ossificação de nosso coração e uma inflexibilidade em relação aos demais.
Ora, tanto o vaidoso quanto o hipócrita parecem viver em função das outras pessoas. A vaidade é, com efeito, uma admiração que gozamos por nós mesmos, fundada na admiração que cremos despertar nos outros. Daí que o vaidoso esteja todo o tempo na superfície de si mesmo, oferecendo-se ao olhar alheio. Também o hipócrita vive em função dos outros, diante dos quais deve se apresentar sempre impecável, indefectível e imperativo, e por isso finge, dissimula, esconde tenazmente seu interior, sua própria natureza. Assim, se o vaidoso busca a confirmação de si pelo outro, o hipócrita quer a afirmação de si sobre ele. De fato, mais correto seria dizer que nenhum deles vive em função de ninguém, mas pretendem que todos vivam em função de si. O vaidoso e o hipócrita não amam nada, pois só amam a si mesmos, e qualquer outra pessoa é só um instrumento temporariamente útil para confirmar esse amor… que digo?!, esse egoísmo. Tudo o que o vaidoso, tolo Narciso, vê nos outros é um momentâneo espelho onde possa namorar a si próprio; o hipócrita, por sua vez, só vê neles um eventual objeto de dominação ou desprezo através do qual possa se afirmar. O vaidoso é vão, vago, vazio, volúvel, porque troca de cor e figura a cada nova moda, tendência ou frisson que os ventos soprem. Troca também as relações e amizades. Daí o seu aspecto frívolo, banal, superficial. O hipócrita, ao contrário, endurece sua personalidade escamoteando toda precariedade, insegurança e fraqueza no interior de uma blindagem implacável. Só assim pode manter no exterior seu aspecto de superioridade. Ambos vivem iludidos com as fantasias de grandeza que vestem sobre si mesmos. Mas por dentro, se o coração do vaidoso é indefinido, inconstante e superficial, o do hipócrita é impenetrável e inflexível. De todo modo, contradição entre aparência e realidade; entre uma riqueza aparente e uma miséria real.
Como a ironia pode despertar nosso espírito vaidoso e hipócrita para as farsas que cria sobre si mesmo? Trocando em um passe de mãos aparência e realidade, verdade e mentira como num truque de mágica, a ironia reflete essa contradição, provocando um repentino disparo elétrico em nossas mentes. Num estalo, o que era obscuro se torna claro. Aos avanços da vaidade e da hipocrisia, o irônico reage com a agilidade de um espadachim: em face do vaidoso, faz-se, como ele, superficial; diante do hipócrita, severo. Mas atenção: em aparência, só em aparência. Refletindo as expressões do interlocutor, coloca-se diante dele como um espelho, ou melhor, como sua própria caricatura, onde subitamente o vaidoso vê sua banalidade; o hipócrita, sua intransigência. De te fabula narratur! Técnica idêntica à do sarcasmo, com uma diferença. Para o sarcástico a ridicularização do outro é um fim, para o irônico é só um meio. O sarcástico delicia seu cinismo esmigalhando as ilusões do próximo, arrancando suas fantasias e abandonando-o nu à própria humilhação. O irônico, se as arranca, não deixa de lhe indicar roupas mais dignas. Revela a mentira para insinuar a verdade. Encenando em si mesmo uma contradição farsesca entre o interior e o exterior, apresenta repentinamente ao outro a sua própria. Se ri com a mesma leviandade do vaidoso, por dentro é sério. Face a face com o hipócrita, ao contrário, mascara-se com seu ar grave, enquanto ri em seu interior. E assim, sugere ao primeiro a profundidade que falta à sua vida; e ao segundo, a irreverência que não tem com a sua.
Mas que sei eu? Há quem tenha dito que tudo é vaidade, e também quem tenha acusado toda a raça humana de hipócrita. Eu, só sei que nada sei, e que Sócrates e Machado sabem alguma coisa. Penso que toda essa filosofia nos subiu à cabeça e estivemos demasiado abstratos – quiçá no mundo da lua ou nalgum outro. Pergunto-me se nossos dois mestres, que além de sábios eram bons poetas, não terão melhor imagem a nos oferecer das vaidades, hipocrisias e ironias deste mundo.
A ironia filosófica de Machado de Assis
É próprio do mesmo homem saber compor comédia e tragédia. O bom poeta trágico deve ser também poeta cômico.
(Sócrates)
Se há algo com que os manuais de literatura concordam sobre Machado de Assis é, em primeiro lugar, que as Memórias póstumas de Brás Cubas marcam a transição de um romantismo juvenil ingênuo para o realismo cético do homem maduro; e, em segundo, sobre o pessimismo de fundo que alimenta toda sua obra. Dizem que teria lido Schopenhauer e incorporado sua visão rabugenta de mundo. Os mais criativos não se contêm e anotam o célebre mote: “Não tive filhos, não transmiti a nenhuma criatura o legado de nossa miséria”. Já veremos seu legado. Mas antes, a pergunta: qual estranha alquimia o Bruxo do Cosme Velho realiza em Brás Cubas? Que ingrediente misterioso terá lançado em suas letras para torná-las assim imortais? Sigamos seus passos.
Quem vasculhar as Relíquias da Casa Velha encontrará um dos primeiros contos do jovem Machado, escrito pelo menos sete anos antes das Memórias Póstumas. Valério, folhetim tipicamente romântico, é obra pouco notável em si, mas intrigante, por ser, segundo creio, em boa dose autobiográfica. O protagonista, como Machado, fora nascido na década de 30 “entre lágrimas” e “criado entre penas” – pobre, órfão de pai e auto-ditada. Espremido entre os dois empregos de cartorário e tipógrafo – os mesmos de Machado em seus inícios –, gastava suas migalhas de tempo livre sonhando com a carreira literária. “Tal era a vida de Valério aos trinta anos; abundância de apetite e escassez de jantares… muito trabalho e pouquíssimos recursos. Nulo passado, escasso presente, tristíssimo porvir. Quando Valério meditava sobre as condições da sua existência, a sua mocidade sem risos, o seu futuro sem esperanças, lançava um olhar melancólico para o suicídio, como solução razoável para o problema da vida… Imediatamente, porém, volvia a sentimentos melhores; encarava severamente a responsabilidade que lhe corria de carregar a vida dignamente, sem violência nem rebeldia; adiava o suicídio para o próximo desânimo”. Mas inadvertidamente a Roda da Fortuna gira e Valério é alavancado de sua penúria às alturas. Contratado a bom preço para compor discursos a um coronel, é introduzido pelo mesmo à fina flor da sociedade fluminense e, mais importante, à flor ainda mais fina que é sua filha – moça lindíssima que, claro, corresponde aos olhares do moço. Sonho vão, infelizmente, pois a Roda gira de novo: seu patrono nada mais era do que um canalha avarento e a menina, aproveitadora e fútil – da sociedade fluminense nem se fale. Uma a uma vão se despedaçando todas as expectativas do jovem escritor. Ao fim e ao cabo, “Valério, que cometera outras tolices na sua vida, coroou sua obra indo atirar-se ao mar”.
Mas suponha – só suponha – que no momento em que o rapaz estivesse na praia, contemplando o mundo pela última vez e a morte pela primeira, um vulto colossal de mulher caísse do céu ou se erguesse da terra – não se sabe –, e, estendendo o braço, o segurasse pelos cabelos, levantando-o ao ar como se fosse uma pluma. Bizarro, eu sei. Mas bizarros são os delírios, e o leitor se lembrará que é assim que Brás Cubas narra o seu às margens de sua própria morte. A mulher é Pandora ou Natureza, “mãe e inimiga”, que o leva “à origem dos séculos” e, fitando-o “com os olhos rutilantes como o sol” e “uma expressão glacial”, lhe revela a quintessência do Universo: o Egoísmo. “Sim, egoísmo, não tenho outra lei. Egoísmo, conservação. A onça mata o novilho porque o raciocínio da onça é que ela deve viver, e se o novilho é tenro tanto melhor: eis o estatuto universal. Sobe e olha”. Subamos também nós, vale a pena:
“Contemplei, durante um tempo largo, ao longe, através de um nevoeiro, uma coisa única. Imagina tu, leitor, uma redução dos séculos, e um desfilar de todos eles, as raças todas, todas as paixões, o tumulto dos Impérios, a guerra dos apetites e dos ódios, a destruição recíproca dos seres e das coisas. Tal era o espetáculo, acerbo e curioso espetáculo. A história do homem e da Terra tinha assim uma intensidade que lhe não podiam dar nem a imaginação nem a ciência, porque a ciência é mais lenta e a imaginação mais vaga, enquanto que o que eu ali via era a condensação viva de todos os tempos. Para descrevê-la seria preciso fixar o relâmpago. Os séculos desfilavam num turbilhão, e, não obstante, porque os olhos do delírio são outros, eu via tudo o que passava diante de mim, – flagelos e delícias, – desde essa coisa que se chama glória até essa outra que se chama miséria, e via o amor multiplicando a miséria, e via a miséria agravando a debilidade. Aí vinham a cobiça que devora, a cólera que inflama, a inveja que baba, e a enxada e a pena, úmidas de suor, e a ambição, a fome, a vaidade, a melancolia, a riqueza, o amor, e todos agitavam o homem, como um chocalho, até destruí-lo, como um farrapo. Eram as formas várias de um mal, que ora mordia a víscera, ora mordia o pensamento, e passeava eternamente as suas vestes de arlequim, em derredor da espécie humana. A dor cedia alguma vez, mas cedia à indiferença, que era um sono sem sonhos, ou ao prazer, que era uma dor bastarda. Então o homem, flagelado e rebelde, corria diante da fatalidade das coisas, atrás de uma figura nebulosa e esquiva, feita de retalhos, um retalho de impalpável, outro de improvável, outro de invisível, cosidos todos a ponto precário, com a agulha da imaginação; e essa figura, – nada menos que a quimera da felicidade, – ou lhe fugia perpetuamente, ou deixava-se apanhar pela fralda, e o homem a cingia ao peito, e então ela ria, como um escárnio, e sumia-se, como uma ilusão. Ao contemplar tanta calamidade, não pude reter um grito de angústia, que Natureza ou Pandora escutou sem protestar nem rir”.
Pausa!… Um grito de angústia! Atingimos o momento extremo do delírio; a voragem da agonia; a vertigem do absurdo – tudo é nada e nada faz sentido. E então, que acontece?… “Não sei por que lei de transtorno cerebral, fui eu que me pus a rir, – de um riso descompassado e idiota”. O riso! “Tens razão, disse eu, a coisa é divertida e vale a pena, – talvez monótona – mas vale a pena. Quando Jó amaldiçoava o dia em que fora concebido, é porque lhe davam ganas de ver cá de cima o espetáculo”. Lá de cima, o espetáculo do mundo, trágico devorar-se das paixões humanas, tornou-se repentinamente… cômico!
Guarda bem esta página, leitor, pois ela vale por muitos tomos de filosofia – “condensação viva” de todos eles. Temo, diante dela, que tanto o realismo quanto o pessimismo de Machado não sejam senão aparência. Coisas de irônico! Em primeiro lugar, custa-me compreender como um romance realista possa ter sido escrito por um… bem, por um morto – um autor defunto, ou melhor, segundo adverte o mesmo, um “defunto autor”. E talvez minha cabeça seja muito dura, mas não acho menos difícil enfiar nela a idéia de que um pessimista amargo tenha se divertido tanto com essa vida. Mas assim é ela vista do alto. De lá via o Padre Melchior, cheio de compaixão viril, o drama de Helena – “eu sou a verdade que afirma, a caridade que consola”, diz ao devastado Estácio. Do alto também a via, com complacência paternal, o Conselheiro Ayres, ora apartando as intermináveis disputas dos gêmeos Pedro e Paulo em Esaú e Jacó, ora unindo as mãos hesitantes dos apaixonados Tristão e Fidélia, ora aliviando o coração em declínio do casal de velhos Aguiar em Memorial de Ayres. De lá, enfim, a vê Deus – ninguém menos – na Igreja do Diabo, divertindo-se com os encontros e desencontros entre os homens e Satanás.
A verdade, leitor, é que assim como Machado se ergue acima do romantismo e do realismo, também se eleva sobre qualquer otimismo ou pessimismo fáceis. Não crês em mim?, crê então no próprio. Ele mesmo tratou de confrontar as duas tendências em Viver!, nas alegorias do titã grego Prometeu e do judeu amaldiçoado Ahasverus. Numa terra desolada surge caminhando este último. Por ter escarnecido as aflições de Cristo no Calvário, foi condenado a perambular pelo mundo até o fim dos tempos. E eles chegaram! (Estivemos na origem dos séculos –
ei-nos agora em seu fim). Derradeiro homem sobre a face da terra, Ahasverus pode finalmente morrer. “Morrer! deliciosa idéia! Séculos de séculos vivi, cansado, mortificado, andando sempre, mas ei-los que acabam e vou morrer com eles. Velha natureza, adeus! Céu azul, terra inimiga, que me não comeste os ossos, adeus! O errante não errará mais. Deus me perdoará, se quiser, mas a morte consola-me”. Triste consolação – pessimismo atroz! Mas uma voz irrompe – não de um homem, mas de um deus. É Prometeu, que, acorrentado ao rochedo onde paga seu próprio suplício pelo furto do imortal fogo olímpico para a raça humana, anuncia o despertar de uma era luminosa: “Os tempos serão retificados. O mal acabará; os ventos não espalharão mais, nem os germes da morte, nem o clamor dos oprimidos, mas tão somente a cantiga do amor perene e a bênção da universal justiça”. Ahasverus, de início cético e resistente, é pouco a pouco contagiado pelo entusiasmo radiante do outro. Finalmente, é-lhe revelado que será ele, ele mesmo!, a semente da nova humanidade: “Uma raça povoará a terra… Nobre família, lúcida e poderosa, será a perfeita comunhão do divino com o humano. Outros serão os tempos, mas entre eles e estes um elo é preciso, e esse elo és tu”. A excitação aumenta à medida que o diálogo se aproxima de uma apoteose: “Rei eleito de uma raça eleita!”, proclama Prometeu, ao que ecoa Ahasverus: “Anda, fala mais… fala mais…” – e assim, segue sonhando… Sonhando?! Sim; era tudo um sonho… Que não nos escape a ironia – como é seu hábito. Um homem que percorreu toda a superfície do globo atravessando incontáveis eras da humanidade, e que a detesta; um deus, isolado pelos séculos em seu rochedo, que a adora. Em qual dos dois encontraremos o espírito de Machado? Nas queixas pessimistas do judeu? Na utopia otimista do grego? Em ambas? Não; olhaste para o lugar errado, leitor. Olha para o alto!, e lá verás duas águias que contemplam a cena. “Ai, ai, ai deste último homem, está morrendo e ainda sonha com a vida”. E a outra: “Nem ele a odiou tanto, senão porque a amava muito”.
Lembra, pois, que se acaso encontrares ódio em Machado, é mera aparência velando um excesso de amor. Seu pessimismo é somente a advertência de quem traz os olhos cansados com as ilusões da vaidade humana. “Creiam-me… Ninguém se fie da felicidade presente; há nela uma gota da baba de Caim”. De minha parte, creio; mas de qual felicidade deveremos nos fiar? Ai, mestre, não nos venha com os feitiços de tua fantasia, não agora; fala com a franqueza do coração ou cala-te para sempre. E de fato ele, viúvo, falou ao amigo Nabuco em derradeira correspondência. “Tudo me lembra minha meiga Carolina. Como estou à beira do eterno aposento, não gastarei muito tempo em recordá-la. Irei vê-la, ela me esperará.” Tê-la-á visto? Creio que sim. E tu, leitor, que crês?
A filosofia irônica de Sócrates
O homem é uma errata pensante.
(Machado de Assis)
“Só sei que nada sei”. Não eu, bem entendido, que sei muita coisa, mas Sócrates, que não sabia nada. Pelo menos assim dizia ele quando a profetisa de Delfos lhe revelou ser o homem mais sábio do mundo. Não sabendo como isso fosse possível, não se fez de rogado, enfiando-se pelas ruas da acrópole para tirar a prova de que os deuses não sabiam bem do que estavam falando. Aos homens, que levavam felizes suas vidas, indagava “que é a vida?”, “que é o homem?”, “que é a felicidade?”, e, desconcertado, descobria que ninguém sabia responder. (Alguém aí sabe?). Até tropeçar nos sofistas, que diziam saber tudo. Um sofista é um homem que lhe ensinará a comprovar e convencer os outros do que você bem entender – pelo justo preço, naturalmente. Círculos quadrados e vacas que voam?; sem problemas!, afinal, é tudo uma questão de ponto de vista – pagando bem que mal tem? “Mercadores de idéias”, ralha Platão – sabedoria a varejo. Mas aí entra Sócrates. “Eu gosto de catar o mínimo e o escondido. Onde ninguém mete o nariz, aí entra o meu, com a curiosidade astuta e aguda que descobre o encoberto” (palavras do autor defunto Machado, mas que cairiam bem ao defunto filósofo). E com sua filosofia “leve e ridente”, “desigual, agora austera, logo brincalhona, coisa que não edifica nem destrói, não inflama nem regela, e é todavia mais do que passatempo e menos que apostolado” (Machado de novo), desmascara a cada um daqueles senhores a própria ignorância – num repente dissolve, kantianamente, toda sua pretensa sabedoria em nada. O que não é pouco! “Aquele que sabe de sua própria ignorância”, diz o sábio russo Soloviev, “já tem alguma sabedoria e pode vir a ter mais. Não sabes nada? – então aprende. Não tens a verdade? – procura-a. Quando a procuras, já está ao teu lado, mas com uma face velada, e do esforço de tua mente depende a retirada do véu”.
Mas então, Sócrates – formidável sátiro! –, sabias afinal de alguma coisa!? Sabia, sim, que a missão conferida pelo Oráculo não passava de uma ironia divina, uma extraordinária brincadeira de Deus, como declara ao júri que o condenaria à morte: “O que eu penso, senhores, é que na verdade só Deus seja sábio, e que [com a revelação de Delfos] ele queira significar que a sabedoria humana vale muito pouco e nada, parecendo que… se serviu do meu nome apenas como exemplo, como se dissesse: Homens, o mais sábio dentre vós é como Sócrates, que reconhece não valer realmente nada no terreno da sabedoria”.
Sócrates sabe que nada sabe. Coisa que também sabe o cético. Só que esse não quer mesmo saber de nada; ao passo que ele, Sócrates, sabe que não sabe… mas deseja saber – o que, convenhamos, faz toda a diferença. Sua sabedoria é, a um só tempo, um conhecimento de seu desejo e um reconhecimento de sua imperfeição. Desse desejo, de Eros, ele sabe bem –
a bem da verdade, é a única coisa de que sabe, como revelou na intimidade dos amigos em um certo baquete regado a vinho e risos. E sabe, porque foi iniciado por outra mulher –
e por quem mais seria? – nos mistérios do Amor: a mística Diotima.
Erguido pelo impulso deste Amor, Sócrates, como Machado, se elevou, segundo consta, pelo menos duas vezes além do mundo – palavra de Platão, no Banquete e no Fédro. E o que é esse Amor? “O Amor é a tendência a possuir o bem eternamente” – eternidade, portanto, do amante e do amado. Mas isso não basta. Pedira a nossos mestres as imagens vivas da poesia e não definições abstratas. Machado nos deu a sua, Sócrates não lha há de negar. O Amor, explica, é filho da Pobreza e do deus da Perfeição. Como a mãe, é miserável, ignorante, feio e mortal. Mas traz em si a nostalgia da herança paterna: inquieto e enérgico, arde em desejos pela sabedoria, a beleza e a imortalidade, e as quer perfeitas. “O Amor, por falta das coisas boas e belas, deseja estas coisas que lhe faltam… É intermediário entre mortal e imortal… Há o poder de interpretar e de levar aos deuses as coisas dos homens e trazer aos homens as coisas dos deuses… E estando entre uns e outros preenche este intervalo, de modo a unir todo o Universo entre si… O que é divino normalmente não se mistura com o humano, mas pela ação do Amor eles mantêm entre si todo tipo de relações”. Beleza perfeita e eterna persegue o Amor; qualquer coisa menos do que isso não pode apaziguar seu apetite ilimitado – e por isso, nesse mundo, ela, a Beleza, acaba sempre por “escapar de suas mãos”. Mas deseja não só “contemplar a Beleza”, e sim “procriar na Beleza”, revela Diotima, que sabe mais. O Amor não é simplesmente uma inclinação contemplativa, mas uma energia criativa. Aquele que ama a Beleza imortal imortaliza-se a si mesmo e às suas criações; da à luz a eternidade no seio do tempo – pois “transforma-se o amador na cousa amada”, segundo Camões. Quem recusa esse Amor permanece um “homem mundano”, uma mera “besta entrecortada por desejos”. Quem, por outro lado, se despe das vãs certezas da “sabedoria humana” e se abre à “sabedoria divina”, “enlouquece de amor” e, inundado por um “fluxo amoroso”, transcende sua humanidade, tornando-se “participante de um destino eterno”: um “homem divino”.
Se Sócrates fosse romano, cristão e se chamasse Agostinho, teria dito: “Nos fizeste para Ti, meu Deus, e nosso coração está inquieto enquanto não repousar em Ti”. Não o sendo, fez outra oração, que repito aqui antes de avançar à conclusão: “Concedei-me tornar-me belo em meu interior, e que todas as coisas que tenho fora estejam em harmonia com aquilo que levo dentro”.
È finita la commedia!
Afinal, finalmente, chegamos definitivamente ao fim! Pedi ao leitor alguns minutos e já lhe tomei muitos. E, enviezados pelas nossas veredas, acabamos indo longe: partimos à cata do Humor e viemos dar no Amor – ironias do Destino, grande brincalhão. Mas assim é a vida neste mundo, ópera estranha e fascinante em que vez por outra “o verso vai para a direita e a música para a esquerda”. Se é trágica, cômica, tragicômica ou comitrágica não sei – talvez todas. Sei que é escrita por Deus, orquestrada e regida pelo Diabo e encenada por nós. Pelo menos é isso que asseverava a Bentinho, “depois de muito Chianti”, um velho tenor italiano em Dom Casmurro – e eu dele me fio. Caiam pois as cortinas e ascendam as luzes! Hora de recolher nossas tralhas.
Aristóteles nos ensinou que o homem é o animal que ri. E ri para que? Para libertar e unir, responde em francês Bergson, para descontrair aquilo que anda contraído em nossa vida – para que ela recupere a graça que perdeu. Só assim pode deixar seu isolamento e se reintegrar à vida de todos, à vida universal, tornando-se o que deve ser: força criativa e expansiva. Mas toda a força da vida humana, ao que parece, não é capaz de descontrair a contração definitiva, o isolamento final: a morte. Eis, no entanto, que vem a Ironia, e nos ensina a desconfiar das aparências. Se essa vida termina com a morte, quem sabe se com a morte não começará a verdadeira vida? Quem saberá dizer se a vida não é só um sonho e a morte o despertar? Machado, diante da morte, soube rir, e rindo seguiu pela vida, à espera de subir ao eterno aposento. E Sócrates, que foi morto por rir da sabedoria dos homens, buscou na sabedoria divina a verdadeira vida, a vida do eterno Amor.
E o humor? O humor é humano. Ri, portanto; ri à vontade da Comédia Humana! Diverte-te! Mas nota que nessa, na de Balzac, a farsa começa bem, mas sempre acaba mal. Lembra que as máscaras nalgum momento caem e que a toda terça-feira gorda se segue uma quarta de cinzas; que a alegria que o humor persegue escapa sempre de suas mãos; que o riso é mero espasmo, gota de felicidade que se dissolve subitamente em nada. Mas lembra também que há outras comédias. Há a Divina, de Dante, onde tudo começa mal e acaba bem, nos braços de Beatriz.
Depois de tantas voltas me gira a cabeça, que, como a de Machado, não encontra “nada assaz fixo neste mundo”, e já não sei mais se ainda sei alguma coisa. Mas sei que dizem por aí de um homem que não precisou se elevar além do mundo, porque já estava lá e de lá desceu. Desceu, dizem ainda, para abrir-nos o coração de Deus, a sua intimidade, e revelar que é Ele mesmo o infinito Amor, o eterno apaixonado. Esse homem, dizem também, se dirigia aos homens com uma pergunta – “que procurais?” -, e entregue às mãos deles enfrentou a morte, desceu aos infernos, e, quando subiu, prometeu que ia para preparar muitos aposentos e um grande banquete, para que lá a nossa alegria seja “perfeita”. Isso é o que dizem. Não sei se é verdade – parece que não. Afinal, era só o filho de um carpinteiro da Galiléia. Mas, ah leitor, olha lá que te olham os olhos da Ironia! Lembra que as aparências por vezes escondem realidades outras – leva em conta aquilo que diz Pascal, que Deus é um “Deus escondido”, e também que “tudo aquilo que é profundo ama o disfarce”, como dizia o louco Nietzsche, outro sátiro. Creio que cada um é livre para crer ou não nessas coisas. O que não me entra na cabeça, sempre dura, é a indiferença. É uma promessa grande demais para não ser levada a sério. É imensa! Um Deus que é puro e absoluto Amor!; uma alegria perfeita!… Talvez seja tudo uma ilusão, não sei. Eu, porém, como Pascal, “só posso ter compaixão por aqueles que gemem sinceramente nesta dúvida, que a olham como a pior das infelicidades, e que, não poupando nada para sair dela, fazem desta busca sua ocupação principal e mais séria”.
Mas tenho de me ocupar pelo momento com minhas próprias promessas, não menos sérias. Prometia mostrar que o humor é sinal de que o homem é um ser metafísico. Os cães da roça, bem como todos os outros bichos – e não raro os homens de negócios – andam sempre muito preocupados porque vivem imersos entre as coisas deste mundo. Olham para elas e sentem cólera, desejo ou medo, mas nunca acham graça, porque não conseguem se destacar, não podem se despreocupar – quando o fazem, dormem. O animal não vê, como Sócrates e Machado viram, que tudo na vida tem dois lados – o lado de cá e o lado de lá. Meu argumento final é simples e com simplicidade o entrego às mãos do leitor: se podemos rir deste mundo, vasto e desconcertado mundo, é só porque pertencemos também a um outro. E quem me garantirá que esta vida, com seus interesses mesquinhos, não é uma ridícula paródia da outra?
E a moral da história?, dessa hás de gostar: é que, por mais desgraçada que vez por outra pareça essa vida, podemos rir dela à vontade – espera-nos a outra, a verdadeira. Paz na Terra aos homens de boa vontade – e alegria aos homens de bom humor. O humor liberta, liberta como o amor. “Ama e faz o que quiseres!”, exclamava Agostinho. E mais: podes também, antes, deves amar a ti mesmo à vontade. Não há vaidade nem hipocrisia nisso. Mas desde que – e eis a condição que purifica de todo veneno! – desde que ames ao próximo como amas a ti mesmo – assim dizia aquele galileu, o judeu abençoado Jesus Cristo. (So, “all we need is love?” No, certainly not! We also need God… But that’s another story). E quanto ao humor? Aquele homem também dizia que temos de nos tornar como crianças; então olha para elas, e com elas aprende a olhar a vida: Olha e ri do que quiseres! Pro quinto dos infernos com os politicamente corretos!, gente incorrigivelmente sem graça. Ri dos outros – isso os libertará. Mas tenta, na medida do possível, rir com eles, e não deles, como se diz às crianças. Envolva-os com teu humor. E, mais importante, a condição fatal sem a qual tudo se infecta: aprende a rir de ti mesmo com a mesma facilidade com que ris do teu próximo. Ri com humildade, ó “criatura da terra”. Sim, porque és feito do mesmo barro que todos nós, e as tolices e ilusões da tua vaidade e hipocrisia são tão ridículas quanto as de qualquer outro.
Creio ter cumprido minha promessa: expor o riso ou expor-me a ele. Talvez não haja afinal nenhuma vida eterna e só nos caiba levar avante o curso desta vida que fluirá seus breves momentos até desaguar num imenso oceano escuro como a noite. Talvez a quintessência do Universo não passe mesmo de um egoísmo brutal que gira com indiferença cega esfacelando os seres do pó ao pó; uma Natureza homicida que devora incessantemente seus próprios filhos. Talvez, leitor, toda essa história de seres tu chamado a tornar-te eternamente belo num mundo perfeitamente bom não seja senão um transtorno cerebral meu; um delírio qualquer de morte ou de amor, como os de Sócrates e Machado. Talvez… Mas essas coisas eu falo a sério. É claro, porém, bom amigo, que se disso tudo só tiras absurdos, és livre para rir!
Marcelo Consentino é doutorando em filosofia da religião pela PUC de São Paulo, mestre em filosofia pela Università Santa Croce de Roma e membro do IFE. Ensina história da cultura ocidental no curso O Ocidente e suas trajetórias (http://www.ocidentalismo.blogspot.com).