Jovens criam controvérsia com revista
“Dicta&Contradicta” chega ao terceiro número, repele rótulo de direitista e ironiza “Serrote” por “certo grau de imitação”
O jornalista Flávio Pinheiro, do Instituto Moreira Salles, que publica a “Serrote”, diz que “nessa área ninguém vai inventar a roda”
MARCOS AUGUSTO GONÇALVES
DA REPORTAGEM LOCAL
Tudo começou com um grupo de estudos de filosofia, no início de 2004, formado por amigos que não eram exatamente do ramo -basta dizer que Guilherme Malzoni Rabello, 25, um dos idealizadores dos encontros, estudava engenharia naval. Aos poucos, o núcleo se expandiu e surgiu a ideia da criação de um instituto cultural, que daria seus primeiros passos apoiado numa revista semestral de ensaios.
No mês passado, a “Dicta&Contradicta” chegou a seu terceiro número reunindo um elenco de jovens desconhecidos, autores estrangeiros pouco divulgados no país, medalhões da direita, como Olavo de Carvalho, e expoentes da recente safra conservadora, caso de João Pereira Coutinho, colunista da Ilustrada.
Por ora, o Instituto de Formação e Educação, que Guilherme preside, não é mais do que um telefone com prefixo paulistano e caixa postal -mas se depender da ambição dos rapazes será muito mais.
“Estamos apenas começando um projeto que pretendemos consolidar no futuro, um projeto de vida”, diz Guilherme, já satisfeito com os primeiros resultados da publicação, que tem um site no endereço www.dicta.com.br.
Para uma revista que chegou às livrarias como uma espécie de objeto não identificado, vender 1.000 exemplares seria ótimo, mas 500, segundo Guilherme, ainda daria para começar. Surpreendentemente, o primeiro número, lançado em junho do ano passado, já chegou à casa dos 2.000.
O êxito parece ter estufado a autoestima do grupo. Na edição mais recente, a “Dicta” endereçou uma irônica mensagem de boas vindas à revista “Serrote”, do Instituto Moreira Salles, chamando-a de “irmã mais nova”: “É uma alegria ver que atingimos o nosso ideal de estimular o debate de ideias no país… ainda que seja à custa de um certo grau de imitação”.
Para o jornalista Flávio Pinheiro, superintendente executivo do IMS e um dos responsáveis pela “Serrote”, não é possível “nem remotamente” falar em imitação.
“Alimento a ideia de uma revista de ensaios como a “Serrote” há anos. Nessa área ninguém vai inventar a roda. Revistas de ensaio já existiram aqui há décadas e há inúmeros exemplos em diversos países.”
Pinheiro vê na “Dicta” uma representante do “pensamento conservador, liberal, que é preciso existir”. Mas não contrapõe a “Serrote” -que já atingiu cerca de 4.000 exemplares desde o início de abril- a esta linha. “A Serrote quer ser inteligente, quer contribuir para a divulgação do ensaio fora da tradição acadêmica, como um gênero que mistura erudição, clareza e audácia de opinião.”
Para Guilherme e o coeditor editor Martim Vasques da Cunha, as duas revistas são concorrentes e isso é estimulante. “Sabemos que a “Serrote” pode trazer coisas interessantes, o que aumenta nossa exigência.”
Pinheiro preferiu ao comentar a revista evitar a classificação de “direita” -termo que Guilherme repele: “O que significa isso exatamente? Eu, com toda sinceridade, não sei. O nosso objetivo com a “Dicta” é justamente questionar esses critérios”.
Mesmo a qualificação de “conservadora” não é bem vista, embora a preferência por temas e angulações dessa orientação seja evidente na revista, que publica, por exemplo, ensaio atacando o modernismo e demonstra simpatia por autores como Edmund Burke e Ortega e Gasset.
“A cultura deveria ser o que julga as ideologias. Tratá-la a partir de conceitos como “conservadorismo” ou “progressismo” leva à consequência de se criar um esquema reducionista, ou seja, falso”, argumenta Guilherme.
A publicação, segundo ele tem “interesses e valores comuns”. Cita entre eles “a convicção de que qualquer resultado intelectual de peso só se consegue atingir pelo estudo e pelo trabalho sério e a primazia da pessoa diante do Estado ou grupos ideológicos”.
Mas esses valores, diz ele, “não são uma causa, e sim uma diretriz.”
Frases
“O que nos interessa é provocar o debate, não fazer a polêmica pela polêmica. Talvez a defesa de ideias seja mais incisiva, mas o autêntico debate nunca foi composto por regras de etiqueta e sim por um único norte: o da honestidade intelectual”
GUILHERME MALZONI RABELLO , um dos idealizadores da D&C
“Uma revista cultural ideológica é uma contradição em termos: a cultura deveria julgar as ideologias. Tratá-la a partir de “progressismo” ou “conservadorismo” leva a um esquema reducionista, falso”
IDEM
Ortega E Gasset, erro de digitação ou ignorância? Isso me faz lembrar de um post do Ruy Goiaba, no falecido Pura Goiaba, no qual ele conta uma historinha do trio de jogadores de futebol José, Ortega e Gasset.
Não conheço a revista do Unibanco, mas não me surpreendo por seu flerte com o ainda chamado progressismo da sinistra herbívora. Fernando Pessoa tem o conto “O banqueiro anarquista”, e os filmes dos “dois filhos de Walther” fazem tudo para ficar bem com gente que lê e escreve (desenha?) a “ilustrada”, é ludibriada pela empáfia do tchico buaraque de cuba e, sei lá, ainda votou na martaxa (ou na insoninha).
Parabéns pelo começo auspicioso, mas ainda há muito chão pela frente, dictosos!
Deixando de lado as serrarias e a mania da Folha de “sim”, “não” e “em termos” (para falar do português famoso como “olha, nós também temos animais de direita entre nós”), o fato é que acompanho a revista desde o início.
Nem sempre os assuntos me interessam – não consegui ler ainda o último número – mas é fato que o nível é muito bom. Também é óbvio que não é a primeira revista de ensaios (já tivemos muitas nos anos 60), mas o que chama a atenção é que talvez seja a primeira a expor idéias que são qualquer coisa menos o tradicional – e já enjoativo – receituário do “pluralismo” da esquerda (olha o rótulo aí…): Guevara (caderno teen), Mao (caderno ilustrada), Marx e filhotes (caderno economia) e Gramsci (caderno política).
Sempre sentirei falta de um artigo sobre economia nesta revista (sinto sempre), mas isto não a desmerece.
Parabéns pela “revolta”.
Foi graças a essa matéria que saiu no jornal que cheguei até vocês. Parabéns pelo trabalho.
Gostei particularmente do “nessa área ninguém vai inventar a roda”… Isso aí turma, bom trabalho para vocês.
Marcos Augusto Gonçalves deveria ter atentado para uma qualidade dos “fazedores” da Dicta: coragem intelectual; essa qualidade é rara no Brasil gramscianizado. Longa vida à Dicta & Contradicta!
Vocês foram mencionados no Valor também.
Humanidades: “Dicta & Contradicta” e “serrote”, duas revistas culturais em formato de livro, exploram novo nicho do mercado editorial brasileiro.
O elogio do ensaio
Por João Villaverde, de São Paulo
Aqui, para assinantes:
http://www.valoronline.com.br/?impresso/cultura/92/5714951/0/o-elogio-do-ensaio##
A Folha não consegue mais ignorar vocês – e vocês sabem que isso não é pouco. Parabéns, vocês estão conseguindo.
Achei a matéria da Folha bem ruim, o jornalista tentou caracterizá-los como “jovens metidos a direitistas”. Isso já era esperado, o autor é, pra variar, esquerdista. Eu sei que é bem complicado recusar um espaço como o da Ilustrada, mas nunca é demais tomar cuidado com a grande mídia brasileira. É saudável supor sempre que ela não vai entender a proposta da revista de vocês. A probalidade maior é que queiram rotulá-los de acordo com os critérios do gramscianismo, como o Marcos Augusto Gonçalvez tentou. Se a repórter for a Laura Capriglione, então, é bom, nem dar entrevista.
Abraços e parabéns pelas revistas, as três edições foram ótimas até agora.
Não é o caso da Dicta e Contradicta, pois sabemos que ela não quer nos ensinar o que pensar, mas nos dá um banquete de textos que nos fazem pensar. Mas qual o problema?Não se pode ser de direita?