Um pouco antes do meio do caminho (pelo menos assim espero!), um belo dia percebi que precisava aprender a ler poesia. Até então, e isso era claro para mim, um “verso” era algo que simplesmente não fazia sentido. “Por que alguém precisa escrever pulando as linhas?” eu me perguntava.
Até o dia que de fato li o primeiro poema e simplesmente entendi que aquilo, daquele jeito e de alguma maneira, fazia sentido. Dizer que depois disso me tornei um leitor voraz seria uma mentira. Não sou um leitor voraz. Pelo contrário, sou um leitor de poucos poemas. Não conheço, nem de perto, os autores que um erudito deveria conhecer. Mas, com o passar do tempo, acho que posso dizer que conheço alguns poemas.
Essa história tem um outro dado curioso. Sem seguir nenhum conselho, querendo apenas adquirir o hábito de ler poemas, percebi que havia uma relação entre entender a poesia e saber de cor o poema. Não havia intenção de decorar nada, mas de alguma maneira só me dava por satisfeito quando conseguia recitar aquilo de memória. A graça está em ter de escrever um parágrafo inteiro sobre uma coisa que sempre foi óbvia. De Homero à maio de 1968!
Por conta disso, sempre gostei muito de ouvir os próprios poetas recitando sua poesia. Dentre a minha coleção, um poema sempre me cativou especialmente – apesar de não ser o único. Trata-se do quinto dos Eleven Occasional Poems do W. H. Auden.
Sei que esse não é um poema muito comentado, nem um daqueles famosos poemas do Auden e na verdade nunca tinha me preocupado com isso. Até hoje!
Pois agora há pouco estava em casa e resolvi ouvir mais uma vez esse poema na voz do próprio. Fazia tempo que não o ouvia e, aliás, este eu nunca soube de cor. Como estava ao computador, achei que seria mais fácil encontrar o poema na internet que levantar e ir buscar o livro na estante. Aí veio o susto: o poema simplesmente não consta no Google. “O que? Como assim? Tudo tem no Google!”.
Não poderia perder a oportunidade de ser o primeiro, e acho que vocês têm muito a ganhar. Leiam e ouçam com atenção – o próprio Auden explica tudo no começo da gravação. Mas, meus caros, sem essa de “Ah, mas é em inglês… E é grande…”. Leitor da Dicta não tem disso!
Então, Pela Primeira Vez na Internet
V. Josef Wheinheber
(1892-1945)
W. H Auden
Reaching my gate, a narrow
lane from the village
passes on into a wood:
when I walk that way
it seems befiting to stop
and look through the fence
of your garden where (under
the circs they had to)
they burried you like a loved
old family dog.
Categorised enemies
twenty years ago,
now next-door neighbors, we might
have become good friends,
sharing a common ambit
and love of the Word,
over a golden Kremser
had many a long
language on syntax, commas,
versification.
Yes, yes, it has to be said:
men of great damage
and malengine took you up.
Did they for long, though,
take you in, who to Goebbles’
offer of culture
countered – in Ruah lossen?
But Rag, Tag, Bobtail
prefer a stink, and the young
condemn you unread.
What, had you ever heard of
Franz Jägersätter,
the St Radegund peasant,
who said his lonely
Nein to the Aryan State
and was beheaded,
would your heart, as Austrian,
poet, have told you?
Good care, of course, was taken
you should hear nothing,
be unprepeard for a day
that was bound to come,
a season of dread and tears
and dishevelment
when, transfixed by a nightmare,
you destroyed yourself.
Retribution was ever
a bungler at it:
dies alles ist furchtbar, hier
nur Schweigen gemäss.
Unmarked by me, unmourned for,
the hour of your death,
unhailed by you the moment
when, providence-led,
I first beheld Kirchstetten
on a pouring wet
October day in a year
that changed our cosmos,
the annus mirabilis
when Parity fell.
Already the realms that lost
were properly warm
and over-eating, their crimes
the pedestrian
private sort, those nuisances,
corpses and rubble,
long carted away: for their raped
the shock was fading,
their kidnapped physicists felt
no longer homesick.
To-day we smile at weddings
where bride and bridegroom
were both born since the Shaddow
lifted, or rather
moved elsewhere: never as yet
has Earth been without
her bad patch, some unplace with
jobs for tortures
(In what bars are they welcome?
What girls marry them?),
or her nutritive surface
at peace all over.
No one, so far, as we know,
has ever felt safe:
and so, in secret regions,
good family men
keep eye, devoted as monks,
on apparatus
inside which harmless matter
turns homicidal.
Here, though, I feel as at home
as you did: the same
short-lived creatures re-utter
the same care-free songs,
orchards cling to the regime
they know, from April’s
rapid augment of color
till boisterous Fall,
when at each stammering gust
apples thump the ground.
Looking across our valley
where, hidden from view,
Sichelbach tottles westward
to join the Perschling,
humanely modest is scale
and mild in contour,
conscious of grander neighbors
to bow to, mountains
soaring behind me, ahead
a noble river,
I would respect you also,
Neighbor and Colleague,
for even my English ear
gets in your German
the workmanship and the note
of one who was graced
to hear the viols playing
on the impaled green,
commited thereafter den
Abgrund zu nennem.
February 1965
Legal, Guilherme. Estou tentando decorar um mais simples: Law, Like Love. Para aqueles que possuem um ingles capenga como o meu pode ser um começo. Auden recitando-o se encontra aqui:
http://www.salon.com/audio/2000/10/05/auden/
Abraço, Zé.